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Poeta Escolhendo Feijão

Um poeta escolhendo feijão
N o parece nada poético
Antes, piegas; na ótica vão
Onirismos – metáforas do imagético
Que pedaços ali se haverão
Como palavras, no profético?
(Que caldo na imaginação
A situação até como arquétipo?)
Um poeta escolhendo feijão
Está em lavração errada

Forfé de Pião Rueiro

A madeira na mão um toco de imbuia cheirosa
Pedindo pro Jora da Marcenaria Estrela tornear
O pião pra jogar com a gurizada na rua descalça
Que a fieira tinha tirado de uma cortina de casa

O Seu Jora só perdeu um instantinho-prosa daí
Surgiu o pião rombudo qual coxinha de frango
Marrom lixado e um prego sem cabeça na ponta
Pro bicho correr doido como a bailar fox-trot

O pião na mão e o movimento no colo da idéia
Rua cheia de piás guris moleques curumins até
O sol de Itararé rachando revólver de mamona
Gibis do Flecha Ligeira na mão e tarde ardendo

Então a fila pra assistir a inauguração do pião
O coração tamborilando rabo de olho na mira
Enrolei a fieira na bundinha do pião maroteiro
E fiz panca de Burt Lancaster depois da maleita

Soltei o pião lazarento (que apelidei de Garrincha)
E ele foi de bubuia e fez reviravolteio na Rua Capilé
Foi um deus-nos-acuda dos guris serelepes to

Poema do Cego Pulando Amarelinha

Para Alberto Frederico Correa Santos

O cego pulando amarelinha
Toma o anjo pela mão
Você só vê o gesto táctil do cego, não
Vê jamais o anjo na sua condução
Em cada estágio de saltar sem pisar na linha.

O cego pulando amarelinha
Parece flutuar num balé
E sonda-o a rua de Itararé inteirinha
Perguntando o que nele enseja tanta fé
Céu e inferno; o cego parece que advinha

O cego e a sua amarelinha
Parece um milagre até
Toma-o pela mão o anjo; o cego se aninha
E pula e salta e vence e acerta o pé
Talvez porque céu ou inferno só dentro da gente é.

Declamar Poemas


Para Regina Benitez


 Não fui feito para declamar poemas
Ter timbre, empostar a voz, tempo cênico
E ainda dar tom gutural em tristices letrais.

Não fui feito para decorar poemas
Malemal os crio e os pincho fora
Para o poema saber mesmo quem é que manda.

Não fui feito para teatralizar poemas
Mal os entalho e deixo que singrem
Horizontes nunca dantes naves/gados.

Não fui feito para perolizar poemas
Borboletas são pastos de pássaros
Assim os poemas que se caibam crusoés.

Não fui feito para ser dono de poemas
Eles que se toquem e se materializem
Peles de pedras permitem leituras lacrimais.

Não fui feito nem para fazer poemas
Por isso nem cheira e nem freud a olaria
Apenas uso estoque de presenças jugulares.

Não fui feito eu mesmo. Sou poema
Bípele, cervejólo, bebemoro noiteadeiros
Quando ovulo sou fio-terra em alma nau.

Condomínio Via-Láctea

A lua nova sobre o arranha-céu
Com rímel de nuvens e sorriso de miss
Não sabe de janelas abertas
No enorme Edifício Vulgata
De arquitectura espacial.

O edifício e o condomínio têm luas
Como tem ruínas e alguns fantasmas
Da rua olho todos os sinais
Janelas abertas são ruas no breu
Muito além do noturnal.

A lua e o breu noturno no alto céu
O condomínio e seus desenredos
As luzes e as janelas abertas
Talvez a Lua seja uma
Válvula de escape sideral.
………………………………………………..

No céu noturno da cidade grande
O prédio é só cimento armado
Mas a lua é uma janela
No Condomínio Via Láctea
Como um jogo de pinball.

Vou-me Embora de Itararé

Vou-me embora de Itararé
Vou servir na Legião Estrangeira
Vou amarrar meu burro na Praça da Paz Celestial na China
Vou namorar a Mia Farrow e me casar direitinho com ela
Ter três filhos, Peter, Paul and Mary

Vou-me embora de Itararé
Vou levar bolinhos de Piruás e Licor de Marolo
Vou contar causos do Zé Maria de Santa Cruz dos Lopes
Vou contar palha dizendo que sou amigo do Pintor Jorge Chuéri
Vou comprar um simca chambord
E tocar saxofone de cambuquira num buraco de Metro de Nova York

Vou-me embora de Itararé
(Minha Santa Itararé das Artes, Cidade Poema)
Vou esquecer o Bar do Calixtrato
Vou entrar para um mosteiro budista de Nepal
Vou amar The Beatles, Mahatma Gandhi e Raquel Welch pedaçuda
Ler as histórias de Bertold Brecht, Vladimir Maiakovski e Frederico Garcia Lorca
E aprender a cantar a Canção da Lua nas montanhas da Rússia czarista

Pito carito, Dito Rufino, vou voltar para Itararé
Co

O homem que virou cerveja

Qualquer ideia que te agrade
Por isso mesmo… é tua
O autor nada mais fez que vestir a verdade
Que dentro em ti, se achava inteiramente nua…